Artista convidado: Robin Fox | "Aftermath" from the record Double Blind
Bandcamp: https://therobinfox.bandcamp.com/
Vídeo: Margarida Azevedo and Ricardo Leiria
Texto: Margarida Azevedo
A máquina mantinha o batimento cardíaco ativo e compassado. Entre pequenos ruídos de mau contacto, num diálogo curto e sem tempo entre o corpo e a mente, ela mantinha-se de braços tombados e pendentes da cama.
As mãos, nem sempre quentes, tinham ligeiros espasmos quando a luz falhava. O laser que lhe atravessava o imaginário fazia com que a máquina apitasse freneticamente e dilacerasse um pouco mais a sua memória.
Ninguém a visitava naquele espaço apertado e sufocante.
Sozinha.
Estava absolutamente só.
Húmido, frio e angustiante. Assim era o seu corpo.
Outrora bailarina. Pés esguios e a apontar para o céu. Agora um corpo inerte com entradas e saídas de corrente.
Outrora bailarina. Agora dançante entre a vida a quatro tempos e a morte silenciosa de uma queda.
Um grito mudo num tempo acelerado pela pressa de chegar a algum lugar.
A queda. Uma simples queda.
E as mãos outrora enérgicas numa dança contemporânea mimética do ambiente envolvente apressado e irascível estão agora alinhadas com os braços quietos, parados e inertes.
Se a boca dela pudesse cuspir palavras. Se a boca dela pudesse acompanhar os pés e as mãos então voltaria a dançar.
A confusão que derivava de uma perceção errática do som invadira noutros tempos todo o seu corpo.
Outrora bailarina.
Pequenas memórias de alguém.
Pequenas.
Muito pequenas.
Tão pequenas que ficam guardadas num pequeno espaço do cérebro.
São choques elétricos. Uns atrás dos outros.
Pequenos e intensos.
Os movimentos transformam-se em sons e as palavras mudas acompanham a transição.
Enquanto lutava com a força da mente um dedo do pé teimava em não mexer. Ora à direita, ora à esquerda. Tudo inerte.
Mais um choque.
E outro.
E outro..
E outro...
Apoderou-se o silêncio longo de uma carícia. Não estava só. Ficaram as memórias do corpo. Outrora um músculo pulsante.
Desligaram-se as máquinas.
Findou o som.
Acabaram-se as palavras.
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